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'Cortar carne vermelha da dieta não é o caminho', defende INCA
Nesta segunda-feira, OMS classificou hambúrguer, linguiça, bacon e presunto como cancerígenos, causando intenso alvoroço a respeito do assunto. Especialistas afirmam que realmente são nocivos e devem ser rejeitados, ao contrário da carne sem ser processada, afirma reportagem de O Dia.
Um novo vilão aparece como protagonista na dieta dos brasileiros. Relatório divulgado ontem pela Organização Mundial da Saúde (OMS) classifica alimentos processados como bacon, hambúrguer e salsicha como cancerígenos para os seres humanos. A carne vermelha não escapou da análise dos cientistas — ela foi considerada fator de risco provável para o desenvolvimento do câncer. O estudo, conduzido por 22 especialistas de dez países diferentes e divulgado pela Agência Internacional de Pesquisa do Câncer (IARC, na sigla em inglês), ligada à OMS, mostrou que, quanto maior for o consumo de embutidos, mais probabilidade de se desenvolver o câncer colorretal — cada porção de 50 gramas (o que equivale à metade de um bife) aumenta o risco de se adquirir a doença em 18%.
São 32,6 mil casos de câncer colorretal registrados por ano no Brasil, sendo 15 mil em homens e 17,5 mil em mulheres.
Já o consumo de 100 gramas de carne vermelha aumenta o risco em 17%. Segundo o estudo, os processados agora estão no mesmo patamar de carcinogênicos como o tabaco, amianto e fumaça de óleo diesel. Já a carne vermelha (de boi, porco, carneiro,bode e cavalo) é comparada a substâncias presentes em herbicidas.
Dados da própria OMS mostram que o câncer colorretal, que afeta parte do intestino grosso e o reto, é hoje o segundo mais diagnosticado em mulheres e o terceiro em homens, matando 694 mil pessoas por ano. No Brasil, segundo o Instituto Nacional do Câncer, em 2014, foram detectados 32,6 mil novos casos dessa doença, sendo 15 mil em homens e 17,5 mil em mulheres. A doença é tratável e, na maioria dos casos, curável se for detectada precocemente, quando ainda não se espalhou para outros órgãos.
‘Nunca vi ninguém morrer por causa de salsicha. Não abro mão do meu cachorro-quente’, diz o taxista Jorge Antônio da Silva, 63 anos.
O Inca orienta que as carnes salgadas e defumadas, embutidos e alimentos industrializados devem ser evitados, por conta do excesso de sal e a presença de conservantes. Mas ressalva que quem não consegue limar os alimentos da dieta, limitem sua ingestão a menos de 500 gramas por semana, o que equivale a cinco bifes.
Presidente da Sociedade Brasileira de Coloproctologia, Fábio Campos concorda que não é preciso cortar o consumo de carne. “Esse é um câncer fácil de prevenir, tanto através de uma dieta equilibrada, quanto pela realização de exames de colonoscopia. Não é preciso deixar de comer nada; apenas manter uma vida saudável e uma alimentação moderada. Além disso, comer a carne juntamente de verduras, legumes e fibras ajuda proteger o intestino. O bom senso é fundamental”, conclui.
A análise do especialista concorda com a opinião dos consumidores. Quem está habituado a incluir carnes e processados na dieta não se sente ameaçado e mostra que não pretende fazer mudanças em seu cardápio. “Sempre comprei muita salsicha e não vou deixar de comprar. Tudo dá câncer! Não abro mão do meu cachorro-quente”, contou o taxista Jorge Antônio dos Santos, de 63 anos.
Thaís Cristina Santos, de 24 anos, só corta os embutidos quando faz dieta. Novo alerta da OMS não mudará seus hábitos, diz ela.
Segundo o diretor do Iarc, Christopher Wild, as descobertas dão mais suporte às recomendações sanitárias atuais para limitar o consumo de carne. Mesmo assim, ele sugere que as novas recomendações não sejam encaradas de forma alarmista, já que a carne vermelha tem valor nutricional. “Esses resultados são importantes para permitir governos e agências regulatórias internacionais para conduzirem avaliações, de modo a equilibrar riscos e benefícios de comer carne vermelha ou processada e para fornecer as melhores recomendações diárias possíveis”.
Em nota, o chefe do programa de monografias da agência internacional, Kurt Straif, reforçou o posicionamento do colega. “Para um indivíduo, o risco de desenvolver câncer colorretal em razão do consumo de carne processada permanece pequeno, mas é preciso ressaltar que esse risco aumenta com a quantidade de carne consumida”, afirmou.
Segundo a nutricionista Danielle Neiva, bacon, salsicha e presunto podem ser substituídos pelo peito de peru assado, cortado em fatias e conservado na geladeira. “Outra opção é usar pastinhas de queijo cottage, salsinha e cebolinha; ricota com cenoura; grão de bico e limão e cottage” , exemplifica, destacando que frutas, verduras, legumes e cereais integrais ricos em vitaminas, fibras e outros compostos auxiliam as defesas naturais do corpo a destruirem carcinogênicos antes que causem danos às células. “Esses tipos de alimentos também podem bloquear ou reverter os estágios iniciais do processo de carcinogênese e, portanto, devem ser consumidos com frequência”, acrescenta.
Ainda segundo a nutricionista, o brasileiro ingere cerca de 45 quilos de carne e processados por ano, o que representa menos de 100 gramas por semana. Mas esse consumo não está ameaçado. Para o especialista em varejo Marco Quintarelli a notícia não deve gerar um impacto negativo no mercado. “As pessoas se valem da relação custo-benefício. A carne está custando R$ 20 o quilo, enquanto a linguiça, a salsicha custam por volta de R$ 8. Então as pessoas trocam mesmo um produto por outro porque é mais barato”, diz.
Por outro lado, a notícia pode gerar um efeito positivo. Ele complementa que a novidade pode levar a indústria alimentícia a produzir produtos menos nocivos, com pouco sódio e nitrato, substâncias presentes nos embutidos. “Mas isso deve acontecer a longo prazo”, ressalva.
Instituição que reúne grandes produtoras de carne, a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec) destacou que, apesar do estudo, o consumo de carne vermelha e outras proteínas traz benefícios nutricionais à saúde humana que “já foram comprovados por pesquisas científicas em todo o mundo”. Ainda segundo a nota, as produtoras investem “no desenvolvimento de proteínas saudáveis por meio de ações que fomentam a segurança alimentar, a saúde do rebanho e, principalmente, a qualidade da carne.”
Reportagem da estagiária Marina Brandão
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