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Transexual denuncia hospital público por omissão, em Duque de Caxias
DUQUE DE CAXIAS - Quando deu entrada, na quarta-feira, no Hospital estadual Adão Pereira Nunes, em Caxias, Baixada Fluminense, a estudante de técnica de enfermagem Kauana Vitória da Silva, de 22 anos, sentia febre e dores causadas por complicações de uma prótese de silicone, colocada no seio há dois anos. Diagnosticada com mastite — infecção na mama —, ela, que é transexual, afirma ter sido constrangida por médicos e funcionários, que a chamavam de “ele” e se recusavam a dizer seu nome social. No pulso, o registro de paciente lembrava a identidade que já não é a sua: Genivaldo Junior da Silva, o nome de batismo. Quatro dias depois, a promessa médica de retirar a prótese, para tratar a infecção, não foi cumprida: Kauana recebeu alta sem a cirurgia.
— Eles me trataram que nem bicho. Aliás, nem bicho a gente trata assim. Voltei para casa com febre e muitas dores no peito — conta Kauana, que relembra o constrangimento: — Sempre que me chamavam por Genivaldo as pessoas me olhavam e eu tinha que explicar.
Por duas noites, Kauana fez jejum de 12 horas para entrar na cirurgia, sempre cancelada pelos médicos. A promotora de eventos chegou a ser levada para a sala de espera na clínica cirúrgica, em que só havia homens — foi a gota d’água para buscar a assistência social do hospital, que a transferiu para uma sala feminina.
— Por que me deram alta alegando que não precisava de cirurgia se, no primeiro dia, me botaram na clínica cirúrgica e mandaram eu me preparar para a operação? — questiona Kauana: — Eu só quero tirar a prótese, mais nada.
Seu marido, Lucas Souza dos Santos, de 19 anos, a acompanhou durante os quatro dias de internação. Preocupado com o estado de saúde da mulher, ele também reclama do tratamento na unidade e diz que o casal não tem condições de arcar com a retirada da prótese fora de um hospital público.
— Nós pedimos para chamar só pelo nome social, eles disseram que não era possível. O que custava colocarem o nome social dela entre parênteses, pelo menos? Assim ela não precisava ser humilhada cada vez que a chamavam para dar os remédios — diz Lucas, que mora com Kauana em Saracuruna, bairro de Caxias: — Eu só não quero perder a minha mulher. Disseram que ela não podia ser atendida no hospital público, mas nós não temos condições de arcar com essa operação em outro lugar.
Os médicos do hospital disseram que Kauana devia se tratar com o cirurgião que implantou a prótese. Porém, a clínica que fica na Tijuca, Zona Norte do Rio, de José Vieira Júnior, responsável pela cirurgia, foi fechada. O cirurgião plástico responde a processos na Justiça e já operou mulheres que tiveram sérias complicações nos seios — pelo menos uma delas morreu.Vieira Junior disse que ainda faz consultas, mas apenas por agendamento.
Risco de infecção que pode levar à óbito
Em casos de infecções como a de Kauana, a prótese precisa ser retirada o mais rápido possível, pois oferece risco de óbito. É o que explica o cirurgião plástico José de Gervais:
— Pode causar septicemia, infecção generalizada nos órgãos que pode levar à morte. Tem que ser retirado rápido, pois essa infecção já está consumindo o organismo e deixando ela mais fragilizada.
O diretor do Grupo Atobá de diversidade sexual, Carlos Alberto Migon, repudiou a atitude dos médicos:
— O hospital deveria estar preparado para receber seus pacientes e precisa aceitar o nome social dela. Sua saúde agora é prioridade, mas quando ela melhorar é preciso denunciar, já que a cidadania dela não foi reconhecida.
A direção do hospital informou que Kauana “foi submetida a tratamento venoso com antibióticos para combater uma infecção e recebeu alta após o resultado dos exames apontarem quadro normal, já sem sinais inflamatórios, com pressão normal e sem febre”. A direção disse, ainda, que no prontuário constam seu nome social e civil da paciente e que seu quadro não indicava a necessidade de uma cirurgia de emergência. “Nesses casos, a paciente é tratada para infecção e orientada a buscar o médico que colocou a prótese, para avaliação do implante, o que foi explicado à sra Kauana Vitória”, diz a nota.
Para denunciar casos de homofobia
DENÚNCIA
No Rio, o disque cidadania LGBT (0800 0234567) está temporariamente fora do ar. Emergências — como violência e discriminação — podem ser denunciadas pelo telefone da Superintendência de Direitos Individuais Coletivos e Difusos: 21 2334-9561. Também é possível denunciar pelo Disque Direitos Humanos: disque 100.
ATENDIMENTO
O Rio Sem Homofobia oferece atendimento jurídico e psicológico e assistência social. A previsão é que seus serviços voltem nesta semana.
DELEGACIA
As delegacias têm de estar preparadas para atender vítimas de homofobia. No Rio, o registro de ocorrência já tem o campo "homofobia" como motivação do crime.
Via Extra
21/03/2016
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